Decorre durante o mês de agosto a primeira parte da missão de cooperação internacional entre Portugal e Brasil, que teve lugar no Pantanal, no estado brasileiro do Mato Grosso do Sul, com o objetivo de prestar apoio à decisão de combate dos incêndios rurais que ameaçam a região. A iniciativa envolveu técnicos portugueses especializados em análise integrada de fogos, decisão estratégica de incêndios e investigação de causas (iniciada numa segunda fase e ainda a decorrer), da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF), do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), e da Polícia Judiciária (PJ). Estes especialistas colaboraram com os coordenadores da Operação Pantanal Sul 2024, liderada pelo Prevfogo/IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). No caso da investigação de causas, a colaboração é feita no âmbito da capacitação de equipas do Prevfogo/IBAMA, que estão a ser treinadas para este fim.
Esta ação surge na sequência de um pedido de apoio do IBAMA e enquadra-se no memorando de entendimento assinado em maio de 2023 entre o instituto brasileiro e a AGIF, com envolvimento das restantes entidades do Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais (SGIFR).
Os incêndios que ocorreram no Pantanal em 2024, já superam, em termos de área ardida, todos os registos anteriores, incluindo os de 2020, o pior ano até esta data. O índice meteorológico de perigo de fogo (DSR) acumulado é o mais elevado desde que há registos, e a área queimada até 8 de agosto atingiu 1,4 milhões de hectares, quase o dobro do que foi registado em 2020 no mesmo período.
O Pantanal, a maior área húmida do mundo, estende-se por um território de 185.000 km², cerca do dobro do tamanho de Portugal. A região, com uma densidade populacional de apenas 1 a 2 habitantes por quilómetro quadrado, tem acessibilidade por via terrestre muito reduzida, o que dificulta a deslocação das equipas de combate aos incêndios, realizadas principalmente por via aérea (helicópteros), com apoio terrestre e fluvial pontual.
Os incêndios no Pantanal progridem principalmente em vastas áreas de vegetação natural e em áreas de pastagem onde a atividade principal é a pecuária extensiva de bovinos. Os ecossistemas da região, incluindo zonas húmidas, matagal-savana, pastagens e florestas, são fortemente influenciados pela relação entre a água e o fogo. A propagação dos incêndios depende do nível de inundação das áreas e dos cursos de água, sendo comum a propagação através do estrato herbáceo, nas florestas através da folhada, e, em alguns casos, de forma subterrânea nas zonas com forte acumulação de matéria orgânica/húmus.
A deteção e monitorização dos incêndios são realizadas sobretudo com base em imagens de satélite e respetivo tratamento, complementadas por informações das brigadas terrestres (BRIF) e de monitorização aérea. As decisões e intervenções focam-se principalmente na gestão do fogo rural, e pontualmente na proteção contra incêndios, com prioridade na proteção de territórios classificados, indígenas, e, quando necessário, fazendas de produção agrária em colaboração com os seus gestores.
As intervenções de supressão são executadas por equipas terrestres que utilizam equipamento moto manual em combate indireto através da abertura de faixas de contenção. São também utilizados meios aéreos e, onde possível, máquinas das forças armadas e de fazendeiros. O bioma Pantanal é composto por ecossistemas adaptados ao fogo e outros sensíveis a este fenómeno, em que a gestão adequada do fogo, com adaptação à nova realidade de diminuição das zonas inundadas e da precipitação é crucial para evitar incêndios catastróficos.
O Presidente do Brasil, Luís Inácio Lula da Silva, promulgou recentemente a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo (PMIF), estabelecendo diretrizes para o uso controlado do fogo no país, uma medida para a qual a região do Pantanal teve um papel significativo. Em 2024, mais de 16 mil hectares foram tratados com queimas prescritas nas Terras Indígenas de Kadiwéu, representando um aumento substancial em relação ao ano anterior (800 ha), graças à introdução de métodos de ignição aérea.
Os técnicos portugueses, integrados no Centro de Coordenação Operacional da Operação Pantanal Sul 2024, em Corumbá, colaboraram com agentes do Prevfogo/IBAMA na monitorização, análise de incêndios e apoio à decisão. Mais recentemente, a missão contou a participação de especialista da Polícia Judiciária para apoiar na capacitação de equipas do Prevfogo na área investigação de incêndios.Esta missão sublinha a importância das cooperações internacionais no combate aos incêndios, permitindo uma troca de experiências e conhecimentos que beneficia ambos os países. A colaboração entre Portugal e Brasil é fundamental para o desenvolvimento de soluções integradas de gestão do fogo, essenciais para minimizar os impactos negativos dos incêndios e promover uma utilização mais racional do fogo nos respetivos territórios.